
RIBAMAR VIEGAS
ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO, TÉCNICO EM PONTES
E ESTRADAS, INSTRUTOR DE DIREÇÃO DEFENSIVA
E CONDUÇÃO, ESCRITOR.
Quando soube que Dona Marilena havia dado luz, Genésio caminhou da pastagem até a sede da fazenda, tal qual uma bomba relógio em contagem regressiva. – Chega de ceroula! Já eram sete filhos homens, e ele só aceitava aquele parto se fosse uma mulher.
Com esse pensamento, Genésio invadiu o quarto da parida e foi logo se predispondo a sentencia-la:
─ Mulher, hoje eu te mando pro céu ou pro inferno?
− Pro céu, compadre Genésio. Nasceu uma menina – antecedeu a velha Fifí Aparadeira, que acabara de fazer o parto.
A bomba Genésio implodiu de tanta felicidade. Era como se estivesse acertado sozinho numa loteria. Genésio pulava, dava soco no ar, vibrava e bradava:
─ Até que enfim, uma mulher! Mulher! ... Mulher! ... Nasceu a minha filha! ... Vai se chamar Maria de Lurdes, nome da minha saudosa mãe. E danou-se a beber cachaça e soltar foguetes. Era felicidade para dar, emprestar e vender.
No interior do quarto, preocupadíssima, Dona Marilena indagou de Fifí Aparadeira:
− E agora, comadre, o quê que eu faço?
─ O jeito é furara as orelhas do moleque, botar brinco e cria-lo como menina, tomando sempre cuidado para ninguém, muito menos o compadre Genésio, veja a bimbinha do bichinho. No mais é rezar para ser sadio, porque levar no médico, nem pensar! Médico, a comadre mesma sabe, a primeira coisa que faz é mandar tirar a roupa.
Banho e troca de frauda da criança, só Dona Marilena fazia, rigorosamente de portas fechada. O vestido de batizado, cor de rosa com um laço na cintura, foi presente do fazendeiro Bitônio Lemos, o padrinho. O nome foi o escolhido por Genésio: Maria de Lurdes. Até porque todos na fazenda já chamavam a criança carinhosamente de Lurdinha. Ao completar quatro anos, Lurdinha começou a indagar da mãe o porquê “daquilo” que lhe parecia estranho. Dona Marilena lhe dizia que “aquilo” sumiria com o tempo, era só não deixar ninguém ver. Aos oito anos, Lurdinha, muito mais curiosa e intrigada, ouvia da mãe que “aquilo” ─ que não parava de crescer – seria corrigido com uma simples cirurgia quando ela completasse quinze anos... Era só não deixar ninguém ver.
Aos treze anos de idade, Lurdinha já era centroavante do time juvenil do povoada e campeã infantil de vaquejada. Genésio, que até então morria de amores pela filha, passara a se impacientar com a que jeitão masculino de Lurdinha:
─ Mulher ─ indagava Genésio ─ que diabo está acontecendo com nossa filha? ... Ela joga bola, derruba novilho, sobe nos muros, caça de bodoque...
─ Nada não, Genésio. É porque aqui na fazenda não tem outra menina e ela só aprende coisa que os meninos fazem. Só isso ─ tranquilizava a mulher.
A festa de quinze anos de Lurdinha foi um verdadeiro banquete. Genésio mandou matar três bois e não economizou nas bebidas. Compareceu gente de toda redondeza. Comeram, beberam e levaram pra casa. A novidade foi a chegada da prima Neuzinha, mesma idade de Lurdinha, que passaria a morar na fazenda, a pedido do seu tio Genésio, para fazer companhia à aniversariante.
Dona Marilena que já andava com a cabeça quente com as afirmações de que Lurdinha fora vista espiando mulher pelada no banhado, fazendo trenzinho com galinha, pata, perua... tratou de tomar suas precauções: alojou Neuzinha num quarto separado e recomendou por demais Lurdinha, para nunca, em hipótese alguma, trocar de roupa na frente da prima. Contudo, a mulher esqueceu-se de recomendar o mesmo a Neuzinha que, logo após a festa de aniversário, na sua primeira noite na fazenda, sem a menor precaução, estrou no quarto de Lurdinha, despiu o sue corpinho de Branca de Neve e convidou a prima para tomarem banho juntas.
Lurdinha, ainda tentou camuflar na calcinha o que já não cabia mais no interior da mesma, e o instinto atrativo falou mais alto, e “ela” chegou junto. A perplexa priminha, após um breve momento de susto, passou a se interessar pela austera surpresa. O namoro da filha de Genésio com a prima foi tão intenso que Neuzinha logo engravidou. Quando a barriga veio a tona, Dina Marilena logo trato de insinuar a Genésio. que um dos rapazes havia feito “mal” Neuzinha, mas não sabia dizer qual. Genésio que não era de “guardar almoço pra janta”, não esperou um minuto para tirar a limpo tamanho desagravo. No mesmo instante reuniu todos da sua propriedade na varanda da sede da fazenda e, energicamente, começou a interrogar Neuzinha:
− Quem te embuchou, menina, foi Clemêncio? ...
– Não senhor! ...
─ Foi Esmério? ...
– Não senhor! ...
─ Foi Catito? ...
– Não senhor! ...
─ Pois então diga de uma vez por todas!!!... Quem é o pai dessa criança que está na tua barriga?!... Vamos diga logo!!!...
– É, é, é, é.... É Lurdinha...
O rosto de Genésio foi ruborizando e, antes dele desfalecer, ainda ouvia da impassível Dona Marilena:
─ Calma, homem, quem sabe se para o seu agrado, nasça um netinho?!...





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