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LÍDER NATO

jjuncal10

RIBAMAR VIEGAS

ESCRITOR LUDOVICENSE


Existe pessoa que já nasce com o dom da liderança. É o denominado líder nato. Essa pessoa, mesmo sob o comando de outro líder, de um jeito ou de outro, acaba destacando-se como tal no seu grupo. O peão de trecho Dantas, natural do Mato Grosso, que trabalhava sob minha liderança nos anos noventa, numa turma de conservação de estradas, apesar de semianalfabeto, era criativo e tinha o dom de atrair para si a atenção dos seus colegas de trabalho. Era um líder nato. Todavia, a mesma facilidade que ele tinha em criar boas situações nas execuções dos serviços, tinha também para sair-se bem das suas treitas, das suas negligências. Mesmo flagrado com a boca na botija, Dantas sempre tinha uma saída espetacular para safar-se de situações adversas. E o pior, como líder que era – sempre sitiado pelos colegas –, as atitudes “mirabolantes” de Dantas em mentir, fingir e enganar (um ator), já estavam sendo vistas com simpatia pelos demais componentes da turma. Oito homens.


Foi numa segunda-feira, por volta das 14h. Dirigia-me para supervisionar a construção de um bueiro na Vila Pedra Preta, em Brumado-BA, quando vi Dantas no interior de um boteco próximo à obra, bebendo uma dose de cachaça. Desapontado, desci do carro e quis me inteirar de tamanha negligência. Abordei a criatura:


─ Dantas! Bebendo cachaça no horário de serviço!?


− O senhor não soube?


─ O quê?


─ Uma lacraia (escorpião) me picou (mostrou-me um diminuto ferimento na mão direita) e me disseram que cachaça com umburana era bom.


─ Que hora foi isso? – Preocupei-me.


− Agorinha!


─ Entra no carro!


Levei imediatamente Dantas ao ambulatório médico da empresa na Vila Pedra Preta e, por lá, a auxiliar de enfermagem me comunicou que havia aplicado o último soro antiofídico pela manhã e que, na falta do soro, bom para picada de escorpião era cachaça com caroço de umburana.


Voltei às pressas ao boteco, e Dantas não fez cara feia ao tomar mais duas doses da cachaça pagas por mim. Em seguida, conduzi Dantas até a residência dele no centro de Brumado. Ao despedir-me dele, fi-lo com um forte e proposital aperto na mão direita.


Antes de dar partida no carro, eu já estava convicto de que não houvera nenhuma picada de escorpião, até porque eu já havia sido picado por um desse peçonhento animal, o local inchou imediatamente, e a dor foi quase insuportável. Portanto, aquele aperto de mão era para Dantas gritar de dor. Fulo da vida por ter sido enganado por aquele peão treiteiro mantive a postura e ainda lhe aconselhei:


─ Acho bom você procurar o médico da empresa. E não precisa preocupar-se com o serviço antes de ficar totalmente curado.


O líder nato e criativo Dantas ─ certamente cheio de glória por ter passado o chefe para trás − só reapareceu na empresa na outra segunda-feira, quando desapontou-se com a sua demissão já batida. Os colegas de serviço de Dantas, cientes do sucedido, despediram-se dele esclarecendo:


─ Pô, cara, já era pra você saber que Ribamar é um “puta velha” de trecho acostumado a tirar a limpo todo tipo de treita prejudicial ao serviço. E levante as mãos para o céu por descontarem apenas a semana que você faltou ao trabalho, porque se não fosse ele intervir, você seria mandado embora por justa causa! (Dessa feita, o líder nato treiteiro se deu mal, ou melhor, sifu).



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