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LAMBAXÉ (A VERSÃO BAIANA DOS BEATLES)


RIBAMAR VIEGAS

ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO, TÉCNICO EM PONTES

E ESTRADAS, INSTRUTOR DE DIREÇÃO DEFENSIVA

E CONDUÇÃO, ESCRITOR.


Zé Lennon (violão e vocal), Pedro Mc Cartney (guitarra solo e vocal), Adamor Harrison (contrabaixo) e Tiziu Starr (bateria). Eram os componentes da banda de música LAMBAXÉ, cujos nomes artísticos, sem dúvida, um tributo a mais famosa banda de rock de todos os tempos, The Beatles.

Oriundos de um Projeto Comunitário para jovens postulantes a músicos, em um bairro da periferia de Salvador, Zé Peba, Pepedro, Adamor Piaba e Nego Tiziu logo se destacaram e, com apoio do professor, maestro, compositor e empresário Florisvaldo (Flor para os íntimos), foi criada a banda LAMBAXÉ, que passou a apresentar-se em praças, festas e clubes sociais, no Recôncavo Baiano. Com os instrumentos alugados no Projeto Comunitário, Flor vendia as apresentações, e a LAMBAXÉ fazia o show. Um negócio que poderia ser bom para todos. Todavia, Flor era o único que estava dando-se bem, ficando com a maior parte do cachê, sobrando para os músicos o do lanche... do jantar... do transporte...

O baixista Adamor Harrison foi o primeiro a rebelar-se:

— Vamos pegar essa zorra toda e se picar da Bahia. Quem toca e canta é a gente mesmo. Carregamos tudo e vamos nos apresentar bem longe daqui. Só assim a gente tira a barriga da miséria.

De cara, o metódico Tiziu Starr discordou:

— Tô fora! Minha religião não permite mutreta. E mais, se formos presos, quem vai apanhar mais sou eu por ser o mais preto. Polícia nenhuma gosta de preto. (Vale dizer que Tiziu tinha sempre uma bíblia ao alcance da mão, e o ídolo declarado do baterista era o apóstolo Valdemiro, de cuja igreja ele dizia ser batizado. A idolatria do baterista pelo dono da igreja mundial era tanta que, fora do palco, ele não abria mão de um enorme chapéu preto, igual ao do apóstolo).

O vocalista Zé Lennon, apesar de chegadíssimo num baseado, era a cabeça mais pensante do grupo e sugeriu:

— A gente se pica da Bahia e enviamos uma carta para o Projeto, agradecendo pelo empréstimo dos instrumentos, prometendo devolver tudo na volta da turnê. Tá ligado?!

— E Flor? - Preocupou-se Tiziu Starr — Já admitindo o seu aval para a empreitada.

— Flor que vá tomar onde ele mais gosta! - Exaltou-se o guitarrista Pedro McCartney - Ou será que não basta o que ele já roubou da gente?...

— E mais, vamos botar na carta que foi ele quem emprestou tudo pra gente. – Falou o maldoso baixista Adamor Harrison.

Às 20 horas de um sábado, o navio cargueiro Raul Suares zarpou de Salvador com destino a Belém do Pará, levando além de carga de soja e a tripulação, a banda de música LAMBA AXÉ – um tio de Adamor Harrison, imediato do navio, quebrou o galho da viagem.

Às 18 horas de uma quarta feira, a LAMBAXÉ desembarcou em Belém do Pará. E uma hora depois, já estava sobre o coreto da Praça Pedro Teixeira, em frente ao porto, tocando uma mistura de lambada com axé para um grupo eufóricos de prostitutas e portuários. Após a apresentação, correram o chapelão do baterista, juntaram uma grana que deu para os gastos imediatos daquela noite. Na manhã seguinte, tomaram café com tacacá, e coube a Tiziu Starr a tarefa de escrever a carta para o Projeto Comunitário e colocá-la nos Correios. O baterista evangélico ainda argumentou:

— Minha religião não permite calúnia. Mas como era para a tranquilidade de todos, a missiva foi escrita, citando o consentimento de Flor para a turnê.

No dia seguinte, a LAMBAXÉ embarcou para Santarém, onde haveria um concurso para grupos musicais, e o prêmio do primeiro lugar era uma grana de respeito. Após dez dias de barco, a banda desembarcou em Santarém, ainda a tempo de se inscrever no tradicional concurso musical da cidade.

A LAMBAXÉ conseguiu hospedagem no mesmo hotel em que se encontrava a banda de carimbó LOS MARAJOARAS, a grande favorita do concurso. Até porque carimbó é o folguedo paixão dos paraenses.

Como de praxe, foi de Zé Lennon o plano para tirar de cena o astro maior da banda LOS MARAJOARAS, o vocalista e dançarino, Vandico Carlos, ocupante da suíte ao lado do quarto da LAMBAXÉ. E, mais uma vez, coube a Tiziu Starr a missão de executar o diabólico plano. De cara, o religioso baterista se recusou:

— Minha religião não permite baixaria!

— Tem que ser você, Tiziu! — Determinou Zé Lennon – Basta ir vestido de pastor, com o chapéu e a Bíblia, sem esquecer o vidro de pimenta. Se não der certo, finge que estava benzendo a suíte para afastar o Satanás. Daqui a pouco, começa o concurso. Vamos chamar o tal Vandico Carlos para nos dar autógrafo, enquanto você entra na suíte e irriga uns cinco palmos do papel higiênico com essa pimenta no tucupi. Enrola e deixa lá. Jogo rápido!... Cantor dançarino sempre vai ao “pinico” antes do show. Tá ligado? (Vale lembrar que pimenta no tucupi, ninguém se atreve a botar mais de um pingo num prato de comida. É quase um ácido sulfúrico). E assim foi feito.

A banda LOS MARAJOARAS se apresentou primeiro e foi aquele Deus nos acuda. Vandico Carlos parecia mais uma cobra na areia quente. Alucinado, ele cantava e dançava fora do ritmo, coçando o trazeiro. Saiu do palco duas vezes para passar gelo, na terceira vez não voltou mais. Vaias... Muitas vaias.

A banda LAMBAXÉ se apresentou em seguida, deitou e rolou tocando lambada, ritmo muito apreciado no Pará. Ganhou em primeiro lugar, recebeu o pomposo prêmio, e seus componentes foram comemorar a vitória no baixo meretrício. Chegaram de táxi e foram gentilmente conduzidos a uma mesa. Um solícito garçom expôs o serviço da casa:

—Temos comida, bebida e mulher!

— Pode trazer cerveja, tira gosto e uma mulher pra cada! — Ordenou Pedro McCartney.

— Nem pensar! Minha religião não permite orgia — argumentou Tiziu Starr.

— Traz vinho pra ele — Mandou o idealista Zé Lennon — Vinho até o Superior bebia e mandava beber.

— Vinho pode ser — concordou a meticulosa criatura, mas rapariga de jeito nenhum!

Comeram, beberam, e três foram conhecer os aposentos das mulheres, ficando na mesa uma mulher e Tiziu Starr.

— Vamos, amorzinho! — Convidou a mulher — Eu tô gamada nessa tua timidez!

— Minha religião condena o pecado da carne antes do casamento. — Justificou-se o melindroso baterista.

— Não seja por isso — disse a mulher, simulando colocar uma aliança no dedo de Tiziu Starr e, cinicamente, proclamar: — até que a morte nos separe!

— Amém! – Conclamou o músico evangélico de mãos postas... E foi!

Os quatro pagavam as contas na portaria: Zé Lennon, R$ 40,00; Pedro McCartney, R$ 40,00;

Adamor Harrison, R$ 40,00; Tiziu Starr, R$ 50,00. Lógico que o impoluto baterista não gostou e quis saber se tratava de mais um caso de racismo. Todos ficaram intrigados com o disparate, Inclusive o porteiro, que se apressou em gritar, criteriosamente, na direção dos quartos:

— Das Dores, por que para os três R$ 40,00 e para o cidadão de cor R$ 50,00?

— A mulher mostrou a cara de bagaço na janela e respondeu:

— Porque esse negão aí exigiu serviço completo: — frente e fundo! (pra quem não queria...)

Após um ano de turnê, a banda LAMBAXÉ vendeu os instrumentos, arrendou um depósito no Acre e transformou-o na IGREJA PARA TODOS, conduzida pelo honorável bispo T. Santiago (sempre com chapelão preto) assessorado por três milagreiros: - Anjo José, Anjo Pedro e Anjo Adamor, todos freneticamente ansiosos em tirar o máximo de grana dos fieis e tornarem-se também milionários religiosos. Em Salvador, Flor deixava a cadeia onde fora preso por apropriação indébita.













 
 
 

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