top of page
Buscar

Matar?... Não!,,,


RIBAMAR VIEGAS

ESCRITOR LUDOVICENSE


Após o Coronel Zezé Cantanhede colocar no mundo Juventino, Damião, Jazi, Benito e Cristóvão, fez nascer Anita. E a caçula do Coronel Zezé e de Dona Lusmila fora criada desfrutando o carinho e os cuidados de todos, tanto na auspiciosa Fazenda Cafezal (orgulho do coronel), como no velho sobrado no centro da cidade, habitat da Família Cantanhede. Dessa forma, xodó de todos, Anita passou de criança à adolescência e de adolescente à moça. Na festa de quinze anos de Anita, compareceu Francelino Nogueira, filho de família tradicional daquele município do Piauí, que propôs namoro a Anita. Recém-chegado da capital com o diploma de Bacharel em Direito, o primeiro advogado filho da cidade, Francelino ostentava também a fama de mulherengo. O Cabaré da Dalva era o seu local de lazer predileto. Ciente disso, a moçoila Anita impôs duas condições para aceitar namorar o Doutor Francelino: que ele se afastasse do cabaré e que o namoro deles ─ no começo − ficasse só entre ele e ela. Bom demais pensou Francelino, Anita deveria estar predisposta a fazer por onde ele esquecesse a mulherada do cabaré. E o melhor, tudo às escondidas. Quanto ao coronel, o boato de que, depois do nascimento de Anita, ele não fez mais “justiças” com fora de costume, o tranquilizara. Sobre os irmãos da moça, esses só se preocupavam com bois, cavalos, porcos, pastos. Era só não se misturar com eles. E o fato de Anita ser menor de idade, os puteiros do sertão estavam cheios de raparigas de idade menor que a dela. E depois, ele era advogado.


Achando tudo favorável, Francelino passou a escalar o sobrado dos Cantanhede na calada das noites e frequentar os aposentos de Anita. Depois de dois meses de intenso namoro, a jovem Anita apaixonou-se e o Doutor Francelino, sentindo-se dono da situação, resolveu esnobá-la terminando o namoro, alegando que as putas do cabaré eram melhores que ela na cama. Não satisfeito, o Doutor Francelino ainda fazia questão de passar em frente ao sobrado dos Cantanhede, a caminho do Cabaré da Dalva, e debochar do sentimento de Anita, dando adeusinho de mão. Anita, apaixonada, limitava-se a chorar e não alimentar-se. Dona Lusmila, percebendo a tristeza da filha, comentou com os filhos e estes se comprometeram a conversar com a irmã e, se fosse o caso, eles tomariam uma atitude.


Juventino, acostumado a arrancar verdades dos empregados da Fazenda Cafezal, convocou a irmã para uma conversa na presença dos demais irmãos. Juventino para Anita:


─ Nós já sabemos do que se trata! Conta pra gente como aconteceu!


Anita contou do namoro dela às escondidas com Francelino Nogueira, das escaladas dele ao sobrado para deitar-se com ela e da alegação do doutor para terminar o namoro.

Motivo mais que suficiente para uma justiça com as próprias mãos. Justiça esta que o pai iria gostar muito de saber depois de feita. Para tanto, não poderiam espantar a caça. Juventino premeditou tudo e orientou Anita:


─ Ele vai voltar! Nenhuma mulher de cabaré se compara contigo! Quando ele se manifestar para voltar ao teu quarto, tu fazes sinal de positivo e nos avisa.


Ao completar duas semanas, Francelino passou em frente ao sobrado dos Cantanhede e sinalizou para Anita que pretendia comparecer no quarto dela naquela noite. Anita fez sinal de positivo.

No horário de costume, às 10h da noite, o Doutor Francelino começou a subir pela lateral do sobrado, ocultado por uma vereda sem luz, alcançou a janela do quarto de Anita – destrancada –, abriu-a e pulou para dentro.


A luz foi acesa e, para surpresa de Francelino, estavam lá os cinco irmãos de Anita com ódio espetado nos olhos. O doutor ainda tentou se jogar pela janela, mas foi agarrado, amarrado com as mãos para trás e teve a boca entupida por um pano de chão. Juventino assumiu o comando da situação e sentenciou:


─ Vamos levar o cabra para a fazenda, lá nós lavamos com sangue a honra da nossa família e botamos fogo na carcaça dele! Todos concordaram balançando as cabeças, evitando qualquer ruído para não acordar o Coronel Zezé, que dormia no quarto ao lado.


Ao ouvir a sua sentença, Francelino “uivou”, o coronel acordou e apareceu na porta do quarto. Estava de chinelas e meia, calça do pijama com o fundilho quase no joelho, botões do dólmã em casas erradas e, esfregando os dedos nos olhos, perguntou com sua voz arrastada:


─ O que está acontecendo aqui?


─ Nós vamos dar fim neste cabra que invadiu nossa casa, desonrou nossa irmã e ainda disse que mulher dama é melhor que ela na cama – esclareceu Damião.


O coronel, aproximando-se de Francelino e examinando-o meticulosamente, indagou:


─ Mas este não é o novo doutor da cidade? Filho dos Nogueira?


─ Sim! É o safado mesmo, pai! – confirmou Benito, enquanto Jazi e Cristóvão botavam mais pano na boca de Francelino.


─ Matar... Não!! ─ ponderou o coronel ─. Trata-se de um rapaz de família tradicional e não fica bem matar o primeiro doutor advogado da cidade!!


Francelino respirou fundo com a ponderação do coronel. Valeu a pena ser doutor!


─ Meu pai, este cabra desonrou nossa irmã, nossa casa, nossa família e vai continuar vivo para contar vantagem? Não estou lhe entendendo! – argumentou impaciente, Juventino.

Sabedor de que o coronel Zezé nunca voltava atrás nas suas decisões, Francelino, no íntimo, já comemorava mais uma das suas bem sucedidas investidas amorosas. Não morreria dessa vez.

O Coronel Zezé Cantanhede, no alto dos seus oitenta anos, sempre decidindo, temperou a garganta com um “hun, hun, hun”, virou-se de costas, deu dois passos em direção à porta do quarto, parou e decidiu:


− Mata?... NÃO!! CAPA!!!













 
 
 

Kommentare


bottom of page