
RIBAMAR VIEGAS
ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO,
TÉCNICO EM PONTES E ESTRADAS,
INSTRUTOR DE DIREÇÃO DEFENSIVA E CONDUÇÃO,
ESCRITOR
Lameuzinho, além de desprovido de beleza e morar longe, era um menino de um comportamento pra lá de esquisito. Vivia mordendo a língua dobrada na boca, braço por cima da cabeça coçando a orelha do lado oposto, calçando sandálias trocadas de lado, vestindo roupa pelo avesso, enfim, Lameuzinho, nos seus trezes anos de idade, já era considerado um caso perdido.
Como toda mãe que se preza, Dona Zefina vivia pegando-se com um e com outro para ver se Lameuzinho desemburrava e aprendia alguma coisa além de subtrair, às escondidas, os doces que Dona Filó – avó dele – fazia para vender.
Naquela tarde, o fazendeiro Armindo, proprietário da fazenda onde trabalhava e residia a família de Lameuzinho, havia feito bons negócios nas compras e vendas de gado e estava mais receptivo às solicitações dos empregados. Concordara em comprar mais vacina para o gado, mais caroços de algodão para enriquecer a alimentação dos bichos e até novas esporas para o vaqueiro Faustino, pai de Lameuzinho. Foi então que Dona Zefina resolveu “abusar”. De mãos postas, como se estivesse diante de um Santo, ela perguntou ao fazendeiro:
− Doutor Armindo, enquanto eu preparo o seu café, será que o senhor podia ensinar umas continhas pra meu Lameuzinho?... O coitadinho só tira zero na tabuada...
Lógico que o fazendeiro achou a atitude de sua caseira um tanto exorbitante − até porque se tratava de Lameuzinho, visto por ele como um zero à esquerda −. Contudo, antes que o pecuarista dissesse alguma coisa, Dona Zefina já havia colocado uma cadeira na frente dele e, sobre a cadeira, Lameuzinho sentado praticando suas esquisitices.
O fazendeiro, querendo livrar-se o mais rápido possível daquela “inconveniência”, foi logo direto ao assunto:
─ Menino, me diga quanto são cinco mais quatro?...
─ Trinta! ─ respondeu Lameuzinho mastigando a língua.
O fazendeiro tirou o chapéu, coçou a cabeça e voltou a perguntar:
─ Pense antes e me diga quanto são quatro mais três?...
─ Vinte! ─ respondeu Lameuzinho passando o braço por cima da cabeça para coçar a orelha oposta.
O fazendeiro, já no limite da sua paciência, resolveu perguntar exemplificando:
─ Preste atenção, rapaz. Se você tiver cinco cocadas e ganhar mais cinco cocadas, com quantas cocadas você fica?
Lameuzinho chegou-se para a frente da cadeira demonstrando todo seu interesse pela pergunta e respondeu no ato:
─ Ora, ora. Fico com dez cocadas.
O fazendeiro voltou imediatamente a perguntar:
─ E se você tiver nove cocadas e comer seis, quantas cocadas vão sobrar?
Lameuzinho nem titubeou:
─Três cocadas.
O fazendeiro foi mais fundo:
─ E se você tiver que repartir vinte cocadas para cinco pessoas, quantas cocadas você dará para cada pessoa?
Lameuzinjho, mais uma vez, tirou de letra:
─ Dou quatro cocadas pra cada.
Aí o fazendeiro resolveu complicar, perguntando:
─ Pois me diga quanto são dezessete divididos por dois?...
Lameuzinho voltou-se para o encosto da cadeira mostrando o branco dos olhos em forma de meia-lua e calou-se. O fazendeiro, buscando a constatação de que Lameuzinho chegara ao seu limite, provocou:
─ Essa eu aposto como você não responde!...
Lameuzinho, sem afastar-se do encosto da cadeira, quis saber:
─ É cocada?... Valendo cocada?...
─ Sim! ─ respondeu o fazendeiro − É cocada, valendo cocada. Ganha dez cocadas se acertar. Aproveita que hoje eu estou num dia bom!
Lameuzinho chegou-se para a ponta do acento da cadeira, desta feita com o braço por cima do ombro coçando as costas e, para surpresa do fazendeiro, respondeu:
─ Oito cocadas e a metade de uma cocada.
Era justificável aquela perspicácia matemática de Lameuzinho. Cocada era o doce que ele mais afanava do tabuleiro da velha Filó.
Contudo, o que fica desse “causo” é a constatação de como a motivação faz a diferença.
(Para o amigo Mindo Azevedo)











Comments