
RIBAMAR VIEGAS
ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO, TÉCNICO EM PONTES E ESTRADAS,
INSTRUTOR DE DIREÇÃO DEFENSIVA E CONDUÇÃO, ESCRITOR
Lobisomem é um mito universal desde a idade antiga. Existe em toda Europa, África e chegou ao Brasil através de Portugal. Tem muitas versões. Em Portugal é produto de comadre e compadre, ou padrinho e afilhada. Na África, aparece sob a figura de homem-lobo, cachorrão, porco. Na minha terra (Maranhão), pode ser o sétimo filho de uma prole só de homens, na qual o primeiro tem que ser padrinho do último, senão este vira Lobisomem. A transformação costuma acontecer na sexta-feira, preferencialmente nas noites de lua cheia... O bicho-homem espoja-se, uiva, ataca e gosta de sangue... E quem sou eu pra duvidar?!
Trabalhando no trecho da FIOL (Ferrovia da Integração Oeste Leste), participei de uma cantoria num distrito de Ibiassucê-BA. Minha apresentação consistiu em tocar e cantar quatro músicas, sendo que a última foi SERAFIM E SEUS FILHOS.
Com o intuito de prender a atenção da pequena, mas agitada plateia, para o desfecho da letra da música − que relata uma desgraça em família, culminada com a transformação do Serafim em Lobisomem − perguntei a todos quem já tinha visto um Lobisomem, e algumas mãos foram levantadas, um bem mais alto que as demais, até porque a pessoa ficou em pé, era uma senhora.
Continuei: − hoje é sexta-feira, noite de lua, portanto, aquele que não prestar atenção na história que vou contar, na volta para casa, pode deparar-se com Serafim transformado em Lobisomem!... É o que dizem! ...
Houve aquele ôôô ─ misto de descrença e aflição. − Dedilhei meu violão e fiz minha apresentação sob um silêncio sepulcral. Fui aplaudido, até porque todos entenderam a história drástica da música. Os ouvintes ainda comentavam o drama, e eu descia a escada do tablado satisfeito com o meu êxito. Esperava-me no pé da escada a simpática senhora que levantara a mão e ficara de pé.
− Boa noite! Muito comovente a música que o senhor cantou! Gostei!
─ Obrigado! Que bom que a senhora gostou!
− Gostei mesmo!... E me comoveu muito porque me fazer recordar uma relação amorosa que tive com um Lobisomem!...
─ Relação amorosa com Lobisomem? ...
─ Sim!... Eu fiz sexo com um Lobisomem!
− Como?... Imediatamente peguei o celular e tentei recorrer ao amigo Zé Walter, o maior perito em causos de Lobisomem que conheço. Afinal, tratava-se de um caso inusitado envolvendo a figura do bicho. Não consegui falar com Zé Walter. Inquieto, voltei a perguntar àquela senhora:
− Como foi? ... na marra? ... A senhora foi parar num hospital? ...
─ Não! .... Eu quis e gostei! ... E só fui parar no hospital depois de nove meses, quando nasceu a criança!
─ Uma criança? ... nasceu com o corpo peludo? ...
─ Não! ... Normal, saudável e linda!... Uma boneca!
─ Onde o Lobisomem a atacou? ...
─ Ele não me atacou, ele me conquistou! – Eu era mocinha e estava numa festa quando o Lobisomem apareceu transformado num homem bonito. Dançamos, e ele me convidou... Não tive como dizer não... Aconteceu!... Engravidei...
─ A senhora tem certeza de que foi um Lobisomem?... Onde foi isso?...
─ Sim! Tenho certeza!... Foi numa romaria em Bom Jesus da Lapa, na margem do Rio São Francisco.
Esse pessoal de romaria apronta cada uma − pensei. – Até porque nem todos são devotos. Lembrei que já tinha ouvido casos semelhantes com outra figura mística que fazia uso desse mesmo expediente − o Boto − e argumentei:
─ Quem costuma aparecer em festas na beira dos rios em forma de homem bonito, vestido de branco para conquistar a donzela, relacionar-se amorosamente com ela, depois virar peixe e voltar para o rio, é Boto. − Por conta dessa lenda, o peixe já levou muita fama sem proveito. − Será que, no seu caso, não é o Lobisomem levando a fama pelo proveito do Boto?... Não seria um Boto o pai da sua filha?...
─ A senhora – com um semblante patético − olhou na direção do céu como se buscasse uma recordação distante, encarou-me esfregando as mãos com se finalmente estivesse lembrando-se de uma grande certeza e retrocedeu:
− Moço de Deus!... Agora lembrei!... Não foi Lobisomem!... Foi Boto!...
− Ufa!!! − Respirei fundo. − Boto me pareceu mais razoável. Pedi licença e fui tomar uma, pensando:
─ Sobrou pro Boto!... Lobisomem fica me devendo essa!






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