A MESMA DE ONTEM
- jjuncal10
- 26 de mar. de 2022
- 3 min de leitura

RIBAMAR VIEGAS
ESCRITOR LUDOVICENSE
Mestre Brás, no alto dos seus 65 anos, era latifundiário, fazendeiro, usineiro e chegadíssimo num rabo-de-saia. E com um cartel desse quilate, lógico que o mestre Brás era um homem de muita habilidade nas suas ações. Por isso era rico.
Mestre Brás tinha por mim consideração e respeitava minhas opiniões técnicas, tanto que viajamos várias vezes para definir serviços de estradas e barragens nas suas fazendas. E foi numa dessas viagens que ele me contou este episódio vivido por ele, envolvendo mulher e, principalmente, muita habilidade para se sair bem.
Mestre Brás trouxe de uma das suas fazendas a sua companhia extremamente necessária: uma mulata esguia, de pernas roliças, ancas largas e dentes perfeitos. Beirava uns trinta anos. Sem sombras de dúvida, um belíssimo exemplar de mulher (eu a conheci). Ele hospedou-a num hotel da sua confiança na cidade onde morava. Naquele mesmo dia, ao cair da tarde, Mestre Brás levou a mulata para conhecer o motel do lugar.
Por volta das sete horas da noite, saíram do motel e foram a um bar da periferia. Por lá, bebiam cerveja e petiscavam tira-gosto, quando passou, fazendo caminhada, uma dama da localidade que o conhecia – uma fofoqueira de carteirinha – e, pelo olhar de repúdio da megera, Mestre Brás logo presumiu: ela vai entregar-me! E não deu outra. Naquela noite, quando ele voltou para casa, a fofoqueira já havia telefonado, sem identificar-se e, maldosamente, disse para Dona Narinha: “olha, sua bestona, enquanto tu ficas aí fazendo jantar para teu marido, ele tá no bar bebendo com outra mulher!”.
Isso foi mais que suficiente para os insultos e insinuações de Dona Narinha perduraram pelo resto da noite. Mestre Brás manteve-se calmo (segundo ele, a calma é um ingrediente imprescindível nessas ocasiões) e portou-se como se nada de anormal tivesse acontecido com ele.
No dia seguinte, Mestre Brás passou pelo hotel, chamou a mulata e lhe deu a seguinte instrução:
─ Hoje, às seis horas da tarde, você vá a um orelhão e telefone para minha casa. Quem vai atender é minha mulher. Quero que diga para ela, exatamente isto...
Às seis da tarde, Dona Narinha ainda botava fumaça pelas narinas de tanto ódio, e Mestre Brás, tranquilo, com uma postura de quase Santo, fazia uns recibos na sua velha máquina de escrever, sentado de frente para ela. O telefone tocou. Dona Narinha apressou-se em atender e ouviu uma voz feminina que lhe dissera exatamente isto:
─ Olha, sua bestona, Seu Brás está agora no mesmo bar, bebendo com a mesma mulher de ontem! E desligou.
Dona Narinha jogou o telefone no gancho e fez um muxoxo indignada, tapando a boca com a palma da mão:
− Meu Deus! Como tem gente infame neste mundo para desgraçar a família dos outros! E, olhando para o “inocente” marido sentado à sua frente trabalhando, compadeceu-se:
─ Minha Nossa! Como pude acreditar em tamanha calúnia e ser tão injusta com quem não merece?!...
Mestre Brás, mantendo-se em silêncio, juntou os recibos na pasta, recomendou à empregada da casa que deixasse alguma coisa de comer para quando ele voltasse de uns pagamentos que iria fazer e saiu para reencontrar a mulata, deixando para trás os mil perdões que Dona Narinha lhe pedia.
Eu, ouvindo a estória na cabine da caminhonete, perplexo com tamanha perspicácia, ainda perguntei:
− Mestre, você, pelo menos, perdoou Dona Narinha para minimizar a aflição dela?
E ele me disse demostrando ainda mais sapiência:
─ Aprende, Ribamar, em situação como essa, em que a parada já nos é favorável, a gente deve se manter calado. Ficar mexendo em angu que já está pronto, o angu corre o risco de embolar!






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