top of page
Buscar

MANGUDA

jjuncal10


RIBAMAR VIEGAS

ENGENHEIRO DE PRODUÇÃO, TÉCNICO EM PONTES

E ESTRADAS, INSTRUTOR DE DIREÇÃO DEFENSIVA

E CONDUÇÃO, ESCRITOR.


O contrabando era de café. Três carretas com excesso de peso. Os fiscais do Estado, Marivaldo e Juvenal, sentindo-se desmoralizados com tantos contrabandos passando pelo Posto Fiscal sob a responsabilidade deles, combinaram agir diferente daquela vez. A tática dos contrabandistas era sempre a mesma: faziam um telefonema anônimo para o Posto, informando o horário e o local por onde o contrabando iria passar. Os fiscais saíam para fazer a campana no local citado, e o contrabando passava pelo Posto sem fiscal. Como a norma de segurança determinava estarem sempre os dois nas mesmas ações, sem alternativa, eles combinaram permanecer os dois no Posto Fiscal naquela noite, independentemente do que informasse o telefonema. Afinal, era pelo Posto Fiscal, sem a presença deles, que os contrabandos estavam passando.

Caía a noite quando o telefone tocou no Posto Fiscal. Quem atendeu foi Marivaldo. O interlocutor informou que o contrabando passaria pelo Posto Fiscal depois da meia-noite, porque os contrabandistas estavam com medo da Manguda (uma visagem em forma de mulher muito alta, trajando mortalha branca, que apavorava os moradores da comunidade depois da meia noite), que estava aparecendo nos acessos secundários. Dos que ala assombrou, alguns desmaiaram, e dois morreram de susto. Marivaldo tremeu nas bases, desligou de súbito o telefone e desconjurou:

─ Cruz credo!

Ao ser informado da horrenda notícia da aparição da Manguda, Juvenal mostrou ao companheiro o arrepio nos braços pelo seu estado de pavor... mais um motivo para eles permanecerem no Posto Fiscal naquela noite.

De olhos e ouvidos atentos a tudo, Marivaldo e Juvenal, no interior da guarita do Posto Fiscal, observaram ansiosos os ponteiros do relógio de pontos se encontrarem no 12, determinando 12h. de uma noite tétrica e de ventos uivantes.

As três carretas carregadas de café pararam bem antes do Posto Fiscal. Sentado sobre a carga da carreta da frente, vestido num poncho branco e fumando um toró de maconha, o carregador Chico Fani (Fani porque falava fino). O proprietário da carga mandou-o descer e ir até o Posto Fiscal certificar-se de que a barra estava limpa para passarem com a carga. Fazia frio, e Chico Fani seguiu na direção do Posto metido no poncho branco, ainda fumando o seu baseado.

No interior da guarita, o telefone tocou. Desta feita, quem atendeu foi Juvenal. Marivaldo, ao ouvir o toque do telefone, passou a mão na barriga e correu para o sanitário. Do outro lado da linha, o proprietário da carga, fez a parte dele, gritando ao telefone, inspirado na figura bizarra do carregador Chico Fani, aproximando-se do Posto Fiscal:

─ A Manguda tá indo pra aí!!!... Se saírem, ela vai pegar vocês!!!...

O aviso e o vento aterrorizante que assobiava no fio do poste em frente fizeram Juvenal sentir calafrio de medo. Sem coragem de abrir a porta pra ver se via alguma coisa, ele arriscou entreabrir a janela e deu de cara com Chico Fani metido no poncho branco, com os olhos maconhados parecendo duas tochas de fogo, que espiava pela veneziana para dentro da guarita. Juvenal só teve tempo de arrombar a porta do sanitário, arriar a calça e disputar com Marivaldo a boca do vaso sanitário.

Do lado de fora, Chico Fani ─ certo de que a situação ficara favorável ─ dava sinal de positivo e quebrava o silêncio da noite gritando para o comboio de café com sua voz de alma sofrida:

─ Pode virrr!!!... Pode virrr!!!... Pode virrr!!!...

Dentro do sanitário, Juvenal e Marivaldo se espremiam ainda mais no vaso sanitário ao ouvirem aquela voz aguda cortando a calada da noite. Enquanto isso, as carretas carregadas de café passavam tranquilamente pelo Posto Fiscal.

Os fiscais Juvenal e Marivaldo ganharam fama de destemidos homens da lei a verem, ouvirem e afugentarem a pavorosa Manguda... Orgulhos da Corporação!













62 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page