top of page
Buscar

NOVA MODALIDADE


RIBAMAR VIEGAS

ESCRITOR LUDOVICENSE


  

           Papada, baiano do Recôncavo, beirava 2 metros de altura e pesava ─ como ele mesmo gostava de gabar-se, − oito arrobas (120 Kg). 


          A feição de papada era tempestuosa. Olhos vermelhos, esbugalhados, nariz e beiços à Raoni. Papada não sorria, trovejava. Não conversava, discursava. Não argumentava, agredia. Orgulhava-se de nunca precisar bater duas vezes para derrubar. A diversão predileta de Papada era abrir “clareira”, distribuindo mãozada na arquibancada da Fonte Nova, nos dias de BA-VI, em Salvador. Papada era “Baheeea”! Adjetivar Papada de brutamonte seria subestimá-lo. Papada era uma espécie de DINOHIPOPOFANTE (tinha fúria de “dinossauro”, feição de “hipopótamo” e corpo de “elefante”). Literalmente um gigante. Papada tinha como hábito, anunciar sua chegada na rua onde morava tocando foguetes. Ele gostava de ver janelas e portas se abrindo para vê-lo chegar, principalmente da casa dele.   


         Naquela tarde, Papada desembarcou da plataforma marítima, onde trabalhava, viajou no ônibus da empresa e chegou ao bairro da Boca do Tubo, onde morava, em Salvador. Ele estava ansioso para chegar à casa e despejar em Dona Vivi (a esposa) seus quinze dias a ver navios em alto mar. 


          Como de costume, Papada passou no boteco de Porreta e pediu três foguete de três tiros e um dose dupla de conhaque – ele era um copo valente, nunca bebia pequenas doses. O barman o informou que só tinha um foguete de um tiro. Papada resmungou mais comprou o foguete. Dessa vez ele não soltou foguete na porta do boteco como era de costume. Guardou-o no bolso. No ambiente, apenas o proprietário, encolhido por trás do balcão, evitando encará-lo e, num canto, com olhar de tenebroso de anu, o seu compadre Cabeção. Após engolir de vez a dose de conhaque e, pressentir a inquietação dos dois, ele deu um murro no balcão e perguntou: 


         ─ Por acaso, eu cheguei fedendo??? 


         Coube a Cabeção – por ser compadre da fera ─ a árdua missão de dar a cruel notícia: 


         ─ É a comadre Vivi, compadre! 


         ─ Morreu? – impacientou-se o espaçoso petroleiro.  


         ─ Não, compadre, pior! Arranjou um “freguês” – despejou Cabeção, na base do seja o que Deus quiser. 


         Papada juntou Cabeção pela abertura da camisa e estrondou: 


        ─ Como é que é??? Tu tá me achando com cara de corno, é??? 


        E Cabeção tirando o dele da reta: 


        ─ Eu, não, compadre! Mas ele... agora mesmo tá lá na sua casa com a comadre! 


        Tal qual um urso furioso em defesa da prole, Papada saiu em passadas largas do boteco de Porreta em direção a casa onde morava no final da rua. 


        Porreta e Cabeção pipocaram ao mesmo tempo:

 

         ─ Vai morrer gente! 


        Os vizinhos, certos de uma tragédia anunciada, já estavam com as portas e janelas trancadas para não testemunharem. 


        Chegando as proximidades da casa, Papada foi diminuindo os passos e, pé ante pé, chegou de mansinho e espiou por uma frecha da janela. Estava lá, sua Vizinha – como ele chamava carinhosamente a mulher – deitada no velho sofá da sala, do jeito que veio ao mundo, atendendo o dito “freguês”. Inexplicavelmente, o semblante do gigantesco petroleiro foi dando lugar a uma expressão cordial de uma foca que quer ganhar peixinhos do seu domador que se encontra alimentando uma baleia assassina. Ele olhou de relance para todos os lados, certificando-se de que não havia ninguém para vê-lo e ouvi-lo, com a mão em concha em volta da boca, rente à fechadura da porta, o temível DINOHIPOPOFANTE Papada emitiu, de fora para dentro da sala, forjando uma vozinha aguda de menino travesso: 


         ─ Lá vem papada!  Corre senão eu vou contar que tu tá fazendo ousadia com a mulher dele!! Em seguida, ouviu-se o estampido do foguete de um tiro.     


         Foi o tempo para o “freguês” de Dona Vivi escapar com a calça na mão pelo fundo da casa. Papada deu mais um tempinho para a mulher se recompor, bateu na porta e entrou recebendo na sua cara de foca pedinchona, os peixinhos, ou melhor, os beijinhos amorosos da mulher.

 

         Para Cabeção, Porreta e demais vizinho o inexplicável é como não houve morte. Mas para a mãe de santo Firmina de Oxóssi, sabedora das coisas, vizinha frontal à casa de Papada, que a tudo observara por uma janela entreaberta, estava esclarecido: o temido brutamonte Papada, não passava de uma nova modalidade de corno: corno fogueteiro. 









 
 
 

Comments


bottom of page