
JOSÉ GERALDO GOMES
Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais pela FDV (Faculdade de Direito de Vitória - 2011); Pós-graduação lato senso em Direito Penal e Direito Processual Penal, Direito Civil e Direito Processual Civil – Fundação Gildásio Amado - Centro Universitário do Espírito Santo (UNESC). Graduação em Direito – Faculdade de Direito de Colatina/ES (atual Centro Universitário do Espírito Santo – 1.990)
PARTE 1/2
Início do inquérito policial
Pelas regras do artigo 5º, Código de Processo Penal, o inquérito policial será iniciado: I – de ofício, isto é, em razão das próprias atribuições que lhes confere a lei, nas hipóteses de infrações penais cuja iniciativa da ação seja atribuída ao Ministério Público, por meio de denúncia.
O delegado instaura inquérito de ofício em duas situações: uma delas nos casos de prisão em flagrante delito. Segundo prescrições do artigo 301 do CPP, “qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”. No primeiro caso, refere-se à prisão em flagrante facultativo. O particular goza dessa faculdade, se assim o quiser e puder fazê-lo.
No segundo, quanto às autoridades policiais e seus agentes, o funcionário imbuído dessas atividades, não é dotado de faculdade e sim, uma obrigação, um dever legal, sob pena de prevaricação. Cuida-se de prisão compulsória. Mas o que é flagrante delito? Flagrante significa o momento em que o sujeito é flagrado no calor dos acontecimentos. Manifesto, incontestável. A resposta prescrita em lei está no artigo 302 do CPP que diz textualmente: Considera-se em flagrante delito quem:
I - está cometendo a infração;
II - acaba de cometê-la;
III - é perseguido logo após, pela autoridade, pelo ofendido, ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração;
IV – é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele autor da infração.
No primeiro caso, fala-se em flagrante próprio. No segundo, flagrante impróprio no terceiro caso, flagrante presumido e no último, inciso IV – flagrante ficto ou fictício.
Em qualquer das modalidades, o preso será apresentado à autoridade com atribuição legal para o procedimento, que ouvirá em termo individualizado, o condutor, as testemunhas presenciais ou instrumentárias, o ofendido, se possível, e por fim, o conduzido. Na sequência, lavrará o auto de prisão em flagrante respectivo, e colherá as respectivas assinaturas em todos os termos.
Não pode a autoridade se omitir quanto à sua identificação para o conduzido, indicar os responsáveis pela prisão, aos motivos da medida restritiva de sua liberdade, e informar ao investigado seus direitos constitucionais, dentre eles, o de ser assistido por advogado de sua confiança; permanecer em silêncio em face de perguntas que lhe forem feitas, sobretudo, as que o incriminarem, não sendo obrigado a produzir provas contra sí. Conceder o direito à comunicação com familiares e advogado, e o mais importante, o respeito à sua incolumidade física e moral. Deverá ao fim das providências cartorárias, comunicar a prisão, enviando cópia do auto respectivo, ao MM Juiz competente, ao representante do Ministério Público e na ausência de advogado particular, comunicar e enviar cópia à defensoria pública. Para maior segurança, deverá comunicar a prisão à família do preso ou pessoa por ele indicada. Nas comunicações aos órgãos oficiais e à família, deverá ser informado o local para onde foi conduzido o autuado. Necessário, pois, que antes do encaminhamento do preso ao centro e detenção provisória onde aguardará audiência de custódia, que seja submetido a exames de corpo de delito, com cópia inclusa aos autos do caderno apuratório.
Importante instituto garantidor dos direitos fundamentais da pessoa privada da liberdade é a audiência de custódia, instrumento processual que tem por finalidade a apresentação do preso a um juiz para avaliação da legalidade ou ilegalidade da prisão. O STF firmou posição no sentido de se proceder a audiência de custódia a qualquer modalidade de prisão. Durante a audiência referida, o juiz tende a perquirir possíveis ilegalidades ou abusos na prisão, sem apreciar o mérito. Sendo ilegal ou abusiva a prisão, esta será relaxada e liberado o preso, com possíveis e eventuais medidas judiciais cabíveis visando apurar os abusos ou excessos praticados. Não havendo ilegalidade e cabendo fiança ou qualquer outra medida restritiva diversa da prisão, será imposta ao preso e da mesma forma, liberado, com as possíveis condições, sob pena de revogação do benefício.
O inquérito será instaurado, ainda, ex ofício, por meio de portaria da autoridade policial, se o investigado não for preso em flagrante delito. Nesse caso, prevê o artigo 5º, § 3º do Código de Processo Penal, que “qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da existência de infração penal em que caiba ação pública poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à autoridade policial, e esta, verificada a procedência das informações, mandará instaurar inquérito”. Nesta hipótese, temos dois momentos relevantes: o da cognição da notícia sobre o evento criminoso, e a instauração do apuratório.
Entre um momento e outro, deve a autoridade investigante, determinar algumas diligências preliminares objetivando certificar-se da veracidade ou procedência das informações, justamente para buscar elementos indiciários aptos a justificar a instauração de inquérito. Tais elementos podem ser representados por uma peça conhecida como “notitia criminis”, via boletim de ocorrência com histórico descritivo resumido e, se possível, nomes dos envolvidos, como interessados (ofendido ou ofensor) e testemunhas, data, horário e local do fato e sua natureza. Às vezes, noticiário jornalísticos, relatórios policiais de investigação prévia, declarações de pessoas que tenham conhecimento do fato etc. Não se exige, a priori, conhecimento prévio da autoria, até porque, o inquérito tem essa finalidade, apurar autoria e materialidade. O que se exige é a justa causa para instauração do feito investigatório.
II – O inquérito será ainda instaurado, mediante requisição do representante do Ministério Público ou do juiz. Nesse caso, a requisição tem força de ordem, não podendo ser descumprida ou ignorada. Normalmente, quando há requisição judicial ou ministerial, significa que o órgão requisitante tomou conhecimento da existência do fato incriminado antes da autoridade policial, ou diante da omissão ou morosidade injustificada na tomada de providências na instância policial, ou suspeita de envolvimento de agente público na prática da infração, ou ainda, por interferência de natureza política, econômica, sentimental ou outra causa escusa.
III – Mediante representação do ofendido ou de seu representante legal, nas hipóteses de crimes que se apure mediante ação penal pública condicionada à representação do ofendido;
VI – Mediante requisição do Ministro da Justiça, nos crimes praticados por estrangeiro contra brasileiro fora o Brasil (art. 7º § 3º,”b”, e os crimes contra a honra do Presidente da República, chefe de governo estrangeiro
V – Nos crimes de ação penal exclusivamente privada, o inquérito somente poderá ser instaurado mediante requerimento do ofendido ou de quem tenha qualidade para intentá-la.
Quanto aos crimes de ação penal exclusivamente privada, a ação é exercida pelo particular ofendido ou por seu representante legal, por meio de advogado legalmente habilitado e munido com poderes especiais, isto é, procuração com cláusula específica, cuja peça inicial é denominada “queixa, ou queixa-crime”. Devidamente fundamentada, contendo os nomes e qualificações das partes: querelante e querelado, dirigida ao juiz competente, o qual apreciará a inicial acusatória com os documentos anexos e imprescindíveis, e uma vez proferindo juízo de admissibilidade, estará iniciada a ação penal de natureza privada, que seguirá seus trâmites legais, até final julgamento.
Portanto, não é correto dizer que a pessoa vai à delegacia de polícia prestar queixa contra fulano de tal, ou que vai à delegacia denunciar fulano. Como visto acima, denúncia é a peça inicial acusatória oferecida exclusivamente pelo órgão do Ministério Público, visando a propositura de ação penal pública. Queixa é a peça inicial acusatória oferecida pelo particular ofendido ou seu representante legal, objetivando a propositura de ação penal de iniciativa privada. Ambas dirigidas ao juiz criminal competente, jamais perante instância policial.






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